Presidencialismo de Coalizão
Para iniciar esse tema, é preciso definir o que é uma coalizão para, então, entrar no presidencialismo de coalizão. Uma coalizão é um acordo político ou uma aliança interpartidária para alcançar um fim em comum. O presidencialismo de coalizão objetiva que o Poder Executivo conduza a administração pública, distribuindo, para isso, postos administrativos em busca de apoio político e a formação de uma maioria parlamentar. O presidencialismo de coalizão é um grande trade-off, uma vez que, em si, é uma troca de favores entre políticos, o que pode prejudicar a democracia, como veremos mais à frente. Contudo, é um sistema inerente ao presidendencialismo no Brasil; isso ocorre devido à disposição de regras do processo legislativo, dando um alto poder de agenda e veto ao Poder Legislativo. Sendo assim, é possível afirmar que, devido à disposição de regras brasileiras em relação ao processo legislativo, para que um presidente consiga colocar em prática suas agendas, é imprescindível que forme uma base de sustentação, de apoio, no Poder Legislativo. Logo, o presidencialismo de coalizão é um “mal necessário” na política brasileira.
Para comprovar essa tese, é preciso olhar para os dados empíricos que nos darão uma noção de como o que foi explicado ocorre na prática. Apresentarei, primeiro, o caso do governo de Fernando Henrique Cardoso, um governo de direita, que, segundo os dados apresentados no livro, de Figueiredo e Limongi, “A democracia brasileira balanço e perspectivas para o século 21”, na página 157, em seu primeiro mandato, o seu partido representava 9,36% da Câmara dos Deputados, já a sua coalizão representava 71,62% da Câmara dos Deputados. O sucesso executivo de FHC, ou seja, a porcentagem de aprovação das políticas que colocava em tramitação era de 78,72%. É importante estabelecer que uma coalizão não objetiva apenas a aprovação de políticas, ela busca também o veto em certas políticas. Isso é extremamente importante para o presidente; para que ele consiga colocar sua agenda em prática, não é somente necessário que ele aprove, mas que ele impeça políticas que possam atrapalhar o seu mandato. Podemos afirmar que o governo FHC foi um governo de direita que obteve sucesso, pois conseguiu colocar inúmeras políticas prometidas durante a sua campanha eleitoral em prática. Assim sendo, constata-se que a coalizão é algo essencial para a governabilidade de um presidente.
Para ratificar essa afirmação de que a coalizão é algo inerente para a governabilidade de um presidente, principalmente no sistema brasileiro, apresentarei agora os dados de um presidente sem a coalizão. O presidente Jair Messias Bolsonaro afirmou, em toda sua campanha, que não se submeteria ao sistema, que não formaria alianças. Para além disso, prometeu também inúmeras políticas, como a legalização de armas de fogo nas casas dos cidadãos comuns. Contudo, até hoje, muitas de suas agendas, como a citada acima, como se percebe olhando para a realidade, não obtiveram sucesso. É preciso salientar que, principalmente na Economia, o ministro Paulo Guedes tem tido grandes dificuldades de ter suas políticas aprovadas. Um dos motivos que justificam isso é a falta de coalizão no governo bolsonarista.Através da análise de dados, compreende-se o motivo disso. Nos primeiros 6 meses de Bolsonaro, ele ainda contava com o apoio do PSL, partido pelo qual foi eleito e que ocupa, atualmente, cerca de 8% das cadeiras da Câmara dos Deputados. Todavia, hoje (2020), o PSL não se encontra mais a seu favor.
Não há dados ainda sobre o sucesso executivo de Bolsonaro, uma vez que o seu governo não acabou. No entanto, exporei a quantidade de propostas enviadas para o Congresso e proporção de sucesso. Em seus primeiros 6 meses de governo, Jair Bolsonaro enviou 34 propostas ao Congresso, das quais foram 18 Medidas Provisórias, 15 Projetos de Lei e uma Proposta de Emenda Constitucional. Entretanto, apenas 4 foram aprovadas pelo Congresso; no caso, 3 Medidas Provisórias e um Projeto de Lei. Levando essa análise em consideração, constata-se que o Presidente da República obteve aproximadamente 11% de sucesso executivo em seus primeiros 6 meses de governo. Nesse sentido, diante de todo o exposto, é possível, sim, afirmar que a coalizão é um fenômeno inerente ao presidencialismo no Brasil. Não há como governar sem que se tenha uma base de sustentação que ampare o governo. Nos primeiros 6 meses, o governo Bolsonaro atuou basicamente por meio de Medidas Provisórias (MP). Contudo, as MPs só têm durabilidade de 60 dias, o que torna a agenda de Bolsonaro impraticada e sem resultados que reverberarão para além de seu mandato. Sendo assim, conclui-se que, durante os seus primeiros 6 meses, Bolsonaro não conseguiu colocar quase nada de sua agenda em prática.
Contudo, é importante ressaltar que não adianta simplesmente ter uma coalizão, é preciso saber administrá-la, saber quando usar qual coalizão, em que momento se deve chamar e sempre manter uma boa relação. Um presidente deve ter várias coalizões na Câmara, pois o multipartidarismo é uma realidade no Brasil. Nesse sentido, cada partido ou candidato eleito tem também em mente os interesses de seu colegiado. Por isso, nem sempre aquela coalizão específica vai aceitar vetar ou aprovar determinada medida. Logo, é preciso que o presidente tenha relações com vários partidos, de interesses diferentes. Além disso, nem sempre é preciso da maioria para a tramitação, aprovação ou veto de determinadas políticas. Nesse caso, cabe ao presidente da República entender exatamente o contexto e os interesses individuais dos partidos, para que chame, no momento correto, cada um deles. Sendo assim, estabelece-se que, para o presidencialismo de coalizão funcionar com efetividade, é preciso um gestor habilidoso. Caso não saiba gerir bem, de nada adianta ter uma coalizão.
Uma vez estabelecido isso, é preciso assinalar os pontos positivos e negativos de uma coalizão para a democracia em si. Um dos grandes pontos positivos da existência de uma coalizão presidencialista é que será possível testemunhar a união de diferentes partidos em prol de uma agenda governamental que pode beneficiar a população como um todo. Além disso, o presidencialismo de coalizão possibilita a prática do sistema de pesos e contrapesos, a qual objetiva um equilíbrio entre os três poderes. Isso ocorre porque, através de uma coalizão, é possível que o presidente e os demais partidos cheguem a um consenso não autárquico, mas em um consenso equilibrado que atende diversas demandas. Por outro lado, o presidencialismo de coalizão tem um papel estratégico para os partidos e representantes, de modo a deixar os interesses da população um pouco de lado. Esse fato pode ser comprovado justamente devido à definição do presidencialismo de coalizão, que basicamente é uma troca de favores, na qual o presidente dá determinados cargos para partidos em troca de apoio no Congresso Nacional. Nesse caso, obviamente que não é escolhida a pessoa mais capaz para determinado cargo e, sim, a pessoa de um partido que dará apoio ao presidente. Nesse sentido, a população não está em "prima facie" (à primeira vista). Ademais, existe um risco constante e iminente de crises, caso o presidente da República não seja muito bom em negociar. Isso ocorre porque, como já supracitado, o Poder Legislativo tem um alto poder de veto e de agenda; caso haja alguma crise dentro da coalizão, existe um grande risco de a política em si parar e, assim, gerar uma instabilidade na ordem política no país, uma vez que a coalizão pode simplesmente parar de votar as propostas ou, ainda, vetar tudo. Isso tornaria o cenário político insustentável.
Júlia Leal
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